Impossibilidade presidencial
O próximo Presidente da República deverá possuir algumas características que reputo de essenciais ao bom desempenho da sua missão em Belém e que ajudem a encontrar a plataforma de consenso adequada ao desenvolvimento e estabilidade de Portugal.
Gostava de ter um Presidente simpático, afável, com boa capacidade de relacionamento pessoal e institucional, sem ressentimentos, que esteja bem com a vida.
Seria muito bom que fosse um homem deste tempo, que conhecesse a fundo os problemas de hoje e os que se vão colocar nos próximos anos, que dominasse os dossiers da economia mundial e nacional, que conseguisse equacionar e acompanhar as linhas estratégicas de desenvolvimento nacional num ambiente global.
Um diplomata, um homem do mundo, no sentido de conhecer personalidades além fronteiras, com uma boa rede de contactos e capaz de granjear boas vontades, simpatia, e afirmar a credibilidade e prestígio do nosso país com as suas relações pessoais e políticas.
Gostaria de ter um Presidente experiente, com obra feita e reputação consagrada na defesa dos mais elementares valores da civilização e da democracia. Alguém que já tenha mostrado aquilo de que é capaz, que não falha quando é preciso.
Se esse futuro Presidente tivesse passado por uma experiência laboral, tal como uma grande parte dos portugueses, e soubesse dar valor ao sofrimento dos trabalhadores e às suas carências, também não ficaria nada mal. Seria mais sensível aos reais problemas dos portugueses.Que fosse um Presidente poeta, sonhador, com capacidade de se emocionar com as coisas belas da vida, que conseguisse transmitir esse quadro aos seus concidadãos, seria uma pérola para todos nós. Um homem que cantasse a liberdade e a fraternidade.
Mas preferia um Presidente jovem, enérgico, inteligente, cheio de iniciativa, de utopia, ao mesmo tempo conhecedor e ilustrado, combativo e com boa capacidade para colocar em cima da mesa temas actuais. Um Presidente que garantisse a estabilidade, fizesse cumprir a Constituição, que soubesse respeitar os outros poderes.
Não quero um Presidente que julgue que pode governar, que vá imiscuir-se nas atribuições e competências alheias. Nem Portugal precisa de um Presidente que levante bandeiras fracturantes da sociedade portuguesa, virando uma parte dos portugueses contra a outra. Tão pouco queremos um Presidente que faça de Belém um centro de intriga palaciana. Também não precisamos de um Presidente faz-de-conta.
Sei que este utópico perfil ideal é a minha impossibilidade presidencial.
Resta-me escolher aquele que mais se aproxima deste perfil. Os portugueses também terão de fazê-lo. É um exercício de cidadania e um dever. Não há escolhas perfeitas. Caberá a cada um escolher em consciência. Ao eleito cabe ser o Presidente de todos e ajudar Portugal a ir mais longe.
A democracia é assim. As escolhas são feitas perante hipóteses concretas que se colocam à consideração do povo. A história demonstrou que o povo eleitor tem sabido, em cada momento, escolher a fórmula certa, doseando excessos, neutralizando potenciais hegemonias, infirmando prognósticos catastróficos, deixando o tempo acalmar as paixões.
Depois de 22 de Janeiro, Portugal vai continuar no seu caminho rumo a uma sociedade mais justa, sem dramas, com um Presidente para unir os portugueses à volta dos desafios e valores essenciais, com um Governo mandatado maioritariamente para governar e poderes regionais e locais que cumprirão a sua nobre missão mais próximo das populações.
Trata-se de uma fórmula complexa mas pensada para, na sua diversidade e legitimidade, cumprir os fins da democracia portuguesa.