sábado, março 11, 2006

Tenho um problema com a minha filha





Telefonou-me um amigo, dizendo que precisava de falar muito comigo. Tinha um problema com uma das suas filhas. Passaram-me logo pela cabeça mil e uma coisas: a miúda meteu-se na droga. Ou está doente. Ou pode estar com algum problema na escola.

O meu amigo é a pessoa mais prestável que conheço. Faz, reiteradamente, quilómetros de carro para ajudar um amigo que precise. Está sempre disponível para trabalhar e para partilhar momentos de alegria.
É um pai galinha, que ia levar os filhos e os amigos dos filhos à discoteca e ficava à espera, de madrugada, dentro do carro, que eles saíssem para os levar de volta a casa.
Tem, tal como eu e muitos dos meus leitores, a educação e os estereótipos que nos foram transmitidos desde pequenos.
-Então pá, o que é que se passa?
-Ando de cabeça perdida há uma semana, com um problema grave.
- O que foi?
- A minha filha tem uma namorada.
- Oh meu amigo (rematei de imediato, sem tentar transparecer a minha incapacidade de dizer muito mais) todos os males fossem esses. Se ela tivesse um problema de saúde, se consumisse droga, se tivesse partido uma perna…
- E logo aquela que era a mais parecida comigo.
- Oh rapaz aconselho-te a assumires a situação, a compreenderes o que se passa, a dar tempo ao tempo.
- E até já teve vários namorados e agora já vai na segunda namorada.
-Pois é meu amigo. Temos de aceitar, não condenar e apoiar a rapariga porque ela vai precisar da tua compreensão e dos irmãos.
- Obrigado. Eu já lhe disse que uma pessoa na situação dela, ainda por cima sendo mulher, tem de se aplicar ainda mais do que os outros e ser independente profissional e financeiramente, pois caso contrário vai ser marginalizada. Tem de se agarrar aos estudos e ser muito boa naquilo que fizer. E quero conhecer a namorada.
Pobre do meu amigo. E logo a ele, homem que casou cedo, muito pretendido, com filhos crescidos, que ainda olha para as catraias que passam, havia da natureza pregar-lhe uma destas.
Quantas filhas têm a sorte e a felicidade de terem um pai a quem possam dizer: “ Oh pai, tenho uma namorada.” Há poucos pais e filhas que consigam dialogar assim e encarar o futuro.
A televisão, a projecção pública do modo de vida dos ídolos, a liberdade, a qualidade de vida e bem-estar concorrem para que estes fenómenos se manifestem, agora de forma mais aberta e visível. Não significa isto que a sociedade compreenda e aceite sem reservas os desvios do padrão. Estes homens e mulheres que gostam de pessoas do mesmo sexo não têm vida fácil na família, na escola, no trabalho, na sociedade. Mas é uma realidade com a qual temos de aprender a lidar. Ela existe. Aliás, sempre existiu. Às claras ou às escuras, dissimulada.
Não sei, nem me interessa se está certo ou errado. É a diversidade que temos de respeitar.
Tem filhos. Pense bem antes dizer alguma coisa. Não vá ele entrar-lhe amanhã pela casa dentro a apresentar-lhe o namorado. Está preparado? Eu não sei se estou.

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