sexta-feira, janeiro 27, 2006

Esquerda, direita, esquerda, direita, volver





Os portugueses andam preocupados com o emprego, com a carteira, com o pão, com a roupa, com a água, com a gasolina, com a escola, com a doença, com a reforma, com a segurança. Penso que este é um facto inquestionável.

Os políticos, por seu lado, andam preocupados com a esquerda e com a direita. Discutem golpes de Estado constitucionais e falam de mais Estado e menos Estado. Perdem-se na arquitectura do sistema político.
Os jornalistas políticos e os comentadores descobrem derrotas à esquerda.
E vaticinam mortes políticas. Diagnosticam tácticas de neutralização de figuras políticas.
Eu acho que estamos perante duas ou três situações muito simples.
Os portugueses querem que os seus governantes criem as condições necessárias para que a sua vida melhore. Querem políticas de emprego. Desejam políticas de educação que formem e garantam maior empregabilidade* aos cidadãos e não sustentem artificialmente o emprego. Queremos líderes que indiquem caminhos, dêem pistas para a nossa realização individual e colectiva. Os portugueses apoiam e concordam com dirigentes credíveis, que lhes inspirem confiança, energia, que julguem capazes de construir um projecto colectivo positivo e com futuro. Em termos simples, querem trabalhar e ganhar dinheiro para viver com qualidade de vida. Desejam uma escola de qualidade para os seus filhos.
Querem acreditar que o futuro será compensador face aos sacrifícios do presente. Procuram segurança e estabilidade. Aspiram a conseguir os bens materiais e espirituais que consideram necessários para o seu bem-estar.
O que as eleições autárquicas e as presidenciais tornam mais evidente é que já não se conquista o apoio dos cidadãos com ideologias de outros tempos, com discursos catalogados de direita ou de esquerda ou apenas com as cores partidárias.
O desafio está lançado. Os partidos portugueses devem repensar novas formas de posicionamento junto dos cidadãos ou, o mais correcto, do mercado eleitoral. As características diferenciadoras, hoje, estão mais ligadas à resposta aos problemas quotidianos dos cidadãos.
A força de atracção eleitoral está cada vez mais ligada à capacidade que os líderes e as suas equipas tenham para demonstrar que têm um projecto de progresso, uma receita de solução de problemas concretos, uma vontade e determinação inabalável na defesa das suas soluções.
O que se pede aos políticos de hoje são soluções criativas para a criação de emprego. O que se pede é um sistema de ensino que não engane pais e filhos numa formação que não serve para nada. O que os cidadãos imploram é que as receitas dos impostos sejam aplicadas em políticas construtivas e que o Estado seja exemplar na aplicação reprodutiva do dinheiro de todos nós.
Para concluir, acho que cada vez mais os atributos pessoais, o perfil e a atitude dos candidatos políticos são preponderantes na capacidade de mobilização dos cidadãos. Outro factor determi- nante é a existência de uma ideia e de um projecto mobilizador. Por fim, realço a importância da capacidade de ler, em cada momento, as necessidades e preocupações dos cidadãos e de responder-lhes através de um discurso coerente e actual.
Estas são as razões que fizeram, em grande medida, as vitórias dos presidentes das regiões autónomas, de muitas autarquias, de José Sócrates e, agora, de Cavaco Silva. O fenómeno Alegre significa apenas uma resposta de cidadãos e de algumas elites a uma situação considerada injusta e politicamente mal resolvida, aliada à concordância com uma postura e discurso anti-aparelhismo. Nada mais do que isto. Enganado andará quem quiser tirar outro significado dos resultados obtidos pelo político Alegre.
Quer isto significar a apologia do pragmatismo político? Em parte sim.
Mas esta atitude não afasta a necessidade de políticos bem preparados, conhecedores da História e do passado das ideias, dos sistemas políticos, da filosofia, da economia, das diferentes disciplinas que concorrem para a governação das nações. Esta é uma condição para governar com sabedoria, coerência e determinação.
*Nota: Entendo a expressão empregabilidade, por oposição a emprego certo e para a vida, como a capacidade que cada pessoa tem de mudar de emprego, fruto da sua formação de base e contínua, da experiência e do desenvolvimento de capacidades que lhe permitam adaptar-se às mudanças do mercado e aos avanços tecnológicos.

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