sexta-feira, maio 05, 2006

São virgens e sérias

João Tocha*



Há uns senhores, com direito a opinião, que volta e meia resolvem desancar nos políticos, nos assessores e nos consultores políticos. Acusam os políticos de cinismo, de privilegiados empedernidos, de embriagados com o exercício do poder, etc. Aos consultores, adjectivam de obcecados com as sondagens e os focus groups, de formatadores e esvaziadores do discurso político e responsáveis pela perda de autenticidade, espontaneidade e da própria personalidade dos políticos.
Acho que não são politicamente sérios quem faz este tipo de acusações. E a falta de seriedade política resulta do facto de muitas dessas figuras, com acesso aos canais de distribuição de informação e opinião, terem elas próprias, ao longo da sua vida, misturado papéis, assumido cumplicidades, construído factos políticos e, cereja no topo do bolo, feito política partidária e terem sido encaixados nas listas para deputados. Eles passaram pelos corredores das sedes partidárias como profissionais da política. A questão é que essas vedetas tão depressa entraram como saíram dos aparelhos.
A falta de seriedade política é o facto de terem um discurso de quem parece estar fora mas, estando dentro ou nas margens, colhe as benesses e capacidade de influência no sistema. Um senão, não cumpriram os seus mandatos até ao fim, defraudaram as expectativas neles depositadas. Da sua passagem pelos corredores do poder não veio mais luz ou substância ao discurso e prática política, para além da vã glória de poderem dizer à família que foram deputados, como os outros.

Já estamos suficientemente esclarecidos sobre os equívocos destes nossos amigos pivots, articulistas, jornalistas, assessores e consultores, políticos, gestores, e um pouco de tudo isto. Vicente Jorge Silva(PS), Manuela Moura Guedes(CDS/PP), Maria Elisa(PSD), a lista seria maior com a inclusão de assessores.

Outra falácia é o atirar as causas de um esvaziamento do discurso político para cima dos consultores de comunicação política. Os acusadores, políticos e profissionais de comunicação, deveriam saber que o melhor que pode acontecer a um consultor de comunicação é trabalhar com um político com forte personalidade, com características diferenciadoras dos restantes e uma organização que possua um programa político diferenciado da concorrência. A autenticidade e a espontaneidade (de políticos preparados e competentes, pois os improvisos dão muito trabalho) são essenciais para a comunicação com os cidadãos. É falsa a percepção de que faz parte das técnicas de comunicação obter o esbatimento do político, no discurso e na prática.

Tal como tenho feito a pedagogia e defesa dos jornalistas contra as críticas infundadas e falsas que lhes fazem, também não aceito que alguns, do alto das suas sentenças opinativas, critiquem os consultores de comunicação política. Quanto aos políticos, acho que são muito mal pagos. Deviam ser todos substancialmente aumentados. E cumprida esta condição, submetidos a um regime de incompatibilidades rigoroso e ferreamente fiscalizados.

Sou apologista de que as travessias do jornalismo para a actividade política e da política para o jornalismo, e aqui incluo assessorias e ocupação de cargos electivos, sejam disciplinadas ou auto-disciplinadas por períodos de nojo e incompatibilidades. São opções diferenciadas de carreira que cada um deve tomar e assumir as suas consequências. A bem da transparência.
Por tudo isto não concordo e acho injusto e errado, do meu ponto de vista, o teor do artigo de Vicente Jorge Silva, “A política ‘clonizada’, DN, de 3-05-2006.
Se perguntarmos a qualquer profissional do sexo o que pensa sobre si própria, tenho a certeza que ela dirá que é séria, fiel, com fortes regras éticas e morais de conduta. E é. Com sorte, até será virgem. Culpa dos cirurgiões plásticos.

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