domingo, abril 08, 2007

Bem lembrado: Boas práticas políticas. De forma simples Rui Machete ajuda-nos a relembrar três critérios para o desempenho de governos e oposições.

« Portugal tem vivido assoberbado com o défice das suas finanças públicas e com a discussão e concretização das medidas necessárias para o combater. Constitui um problema real e muito sério. Parece incontestável. Tem sido, aliás, em grande parte por via dele que outras grandes questões começam a ser discutidas com maior grau de profundidade e de realismo.

A educação deixou de ser predominantemente olhada sob a óptica de doutrinas pedagógicas e carregadas de idealismos utópicos e de ideologia, para se passar a ter em conta os resultados do sistema, e a avaliar as instituições e a medir o que produzem.

O critério do grau de satisfação do utente e do custo para o erário público das soluções alternativas passou, ainda que timidamente, a fazer parte das ponderações feitas no acto de decidir as soluções a adoptar.

O Serviço Nacional de Saúde tem sido o mais conhecido e contestado exemplo desse reexame a que a vasta gama dos serviços públicos tem sido sujeita.Por fim, são a própria administração pública, como organização, e os seus funcionários objecto dessa preocupação de melhoria da qualidade e eficiência e da redução de custos.

É um movimento geral imposto pela necessidade premente de reequilibrar o Orçamento, mas que se torna muito positivo, independentemente da pressão concreta e imediata de evitar gastar mais do que os recursos de que se dispõe. Apenas os beneficiários directos do despesismo incapazes de ultrapassar a sua visão egoísta de curto prazo poderão estar contra, ou também ainda aqueles que utilizam todas as situações negativas aos governos em posto, sejam elas de que natureza forem.

É igualmente verdade que as manifestações de rua, orquestradas pelas forças políticas defensoras do statu quo ou do quanto pior melhor para, mais tarde, tentarem impor os seus esquemas revolucionários e liberticidas, são encaradas por alguns como sintomas importantes do desagrado e da desaprovação do eleitorado, como meios de pressão eficazes para alterar políticas. Há que lhes dar, todavia, o valor que realmente têm, mas não substituí-las ao voto em eleições gerais.

Neste quadro, propício em princípio a um juízo favorável a quem toma decisões difíceis e num primeiro momento impopulares, três princípios-chave são importantes, que, a não serem tidos em conta, legitimam a crítica dura e até a eventual reprovação política geral.

Reporta-se o primeiro ao imperativo de os governos, ao aplicarem as medidas restritivas, assumirem eles próprios um comportamento exemplar. Terem eles mesmos carácter. Não podem prosseguir interesses próprios ilícitos ou usar critérios ou regras para si e seus amigos diferentes dos aplicados aos restantes. A exigência ética do rigor e isenção económica é, num período de carência, particularmente elevada.

Em segundo lugar, torna-se necessário que a justiça social seja estritamente observada. Quando as dificuldades aumentam, é preciso ter em atenção que os sacrifícios hão-de ser repartidos por todos de acordo com a condição económica de cada um. Há que observar o princípio da proporcionalidade nas restrições, e para além de certa fasquia para os mais pobres, o limite nas remunerações e despesas individuais tem de ser absoluto.


Por último, as políticas preconizadas devem ser as correctas e competentemente aplicadas de modo a produzir os resultados esperados.

Num Estado democrático onde as liberdades devem ser respeitadas e a regra de alternância observada, cabe à oposição ajuizar se os princípios orientadores acima enunciados são cumpridos e demonstrar quando o não sejam. Haverá, aliás certamente sempre muita divergência legítima sobre o seu modo de aplicação nos casos concretos. O processo de discussão das soluções individuais e a prova da bondade ou inconveniência das terapêuticas a aplicar alimentam a vida pública e fazem parte da natureza do combate político.Mas partidos do Governo e da oposição não poderão esquecer-se de que o que conta no juízo do eleitorado, afinal, saber quem serviu o bem público. Governo e oposição têm de estar sempre conscientes de que se é viável ocultar factos ou impedir avaliações durante algum tempo, não é possível iludir os votantes no longo prazo.

É determinante para o nosso futuro que governantes e oposição não caiam na tentação de esquecer as boas práticas da vida política democrática, deixando-se conduzir pura e simplesmente pela ânsia do poder.»

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